A aluna Alexia de Souza Sepulchro da 7ª Série do Ensino Fundamental e sua professora Franciane Smarzaro, da EEEFM "Padre Antônio Volkers", foram classificadas como semifinalistas da Olimpíada de Língua Portuguesa 2012 na categoria Memórias. Segue abaixo o texto concorrente.
As marcas da alegria
A madrugada já se despedia, e
singelamente a manhã se aproximava.
Antes mesmo que o galo cantasse eu já despertava. Ainda meio tonto de
sono abria as janelas do meu quarto,
o vento frio acariciava meu rosto deixando com que a pura e branca
neblina adentrasse em minha pequenina casa de tábua onde morávamos. Era manhã de sábado, dia em que o
trabalho começava mais tarde e eu podia brincar como toda criança. Antes mesmo
que eu raciocinasse, o cheiro do café fresquinho feito no fogão a lenha apurava
meu olfato, fazendo meu estômago cantar em altos tons a desagradável melodia da
fome. Então corria para a mesa do café, conseguida com o suor do trabalho de
todos, inclusive o meu. Comia tudo rapidamente e num piscar de olhos estava na
rua.
Durante a semana acordava ainda mais cedo,
me arrumava vagarosamente e colocava meu caderno claramente gasto dentro da
sacola de arroz - era o recurso que tinha para carregar meus materiais. Pegava
meu chinelo de borracha que já estava pequeno em meu pé e partia cantarolando
para a escola. Mas nos finais de semana era tudo diferente, eu me deliciava com
o jogo de futebol no campo do seminário, que no passado foi uma escola de
padres, e hoje tornou-se um centro de culturas religiosas da igreja matriz de
nossa cidade Marilândia. A grama chegava brilhar de tão verde. Então
amassávamos com os pés os viçosos capins que preenchiam aquele lugar para jogar
a famosa meia-linha, e era nesse momento que os olhos dos oito jogadores
brilhavam, e eu, aquele menino franzino, era quem chutava a bola. Ao realizar o
gol corria para o abraço, mesmo que por pouco tempo, me tornava o herói de um
grupo.
Após o término do jogo, ficava ofegante, fadigado,
olhava para o relógio da igreja e como ainda tinha tempo, seguia em direção ao
rio Liberdade. O Sol já brilhava e o céu
azul límpido transparecia alegria, criando a oportunidade para que a
ponte de madeira se transformasse em um perfeito trampolim e cair de braços
abertos nas águas cristalinas ainda sem poluição. Já dentro do rio, o trampolim voltava ser ponte, o
ranger dela com o passar dos carros me assustava, então eu mergulhava e o
frescor da água no meu rosto deixava as marcas de um mundo ainda sem poluição,
se misturando com o leve calor que sumia com as águas que passavam. Quando
lembro, lágrimas vêm aos meus olhos,
pois aquele rio, palco de diversas histórias, transformou-se em um pequeno riacho
que clama por vida. Não quero esquecer aquele lugar, que há muito tempo só
existe em minha
memória. Aquela abundância
em cores foi desmanchada pela revolução dos seres que mais necessitam dela.
Ainda guardo em minha memória o som do sino
da igreja me dizendo: É meio-dia, hora de trabalhar! Então corria para casa,
pegava minha carrocinha de picolé e saia pela rua cantarolando a famosa cantiga
de quem vendia sorvete no palito. Com isso deixava de ser a alegre criança para
ter comigo a responsabilidade de um adulto. Passava a tarde sob um sol que
castigava minha delicada pele, deixando as mãos calejadas de um menino que
passava grande parte de seu tempo empurrando um carrinho.
Depois de andar várias horas pelas pequenas,
mas cansativas ruas da cidade, o dia acabava e eu voltava para casa exausto.
Passava por um caminho onde a escuridão prevalecia. As sombras das árvores
refletidas pela lua, projetavam imagens que me amedrontavam. O medo era
visível, sentia um aperto no peito,
uma pausa na respiração. Torcia bem forte para que tudo passasse logo. Já
perto de casa podia sentir o cheiro do bolo quentinho que me trazia o alívio,
fazendo com que eu flutuasse e deixasse marcado em minha mente o doce sabor de
uma infância feliz.
(texto baseado na entrevista
feita com o senhor Alex Sepulchro de 37 anos)